"Eu respirava naquelas salas, como um incenso, esse cheiro de velha biblioteca que vale todos os perfumes do mundo." Antoine de Saint-Exupéry

quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

TAMBÉM, OS ENCANTOS DO SOL

Capa: Schäffer Editorial.
Este romance é resultado da bolsa de criação literária MinC-Petrobras e sai pela Escrituras (SP). Comecei a escrevê-lo em 2004, ampliando o argumento de um conto, lido por Ângela Vilma e elogiado, com esta ressalva: "É história para mais páginas". Crítica e teórica da obra do grande Herberto Sales, que foi com igual êxito contista e romancista, Ângela Vilma sabe o que está dizendo, e como sabe!, e me incentivou, com aquele comentário, a transformar aquela história breve num romance ou, talvez, numa novela, como eu prefiro chamá-la. Foi o texto que escrevi que me deu mais prazer, até aqui. Ficar oito anos envolvido, ainda que como criador, com vários personagens é uma experiência única, e acho que alguns escritores protelam a conclusão de seus romances ou novelas não somente porque são rigorosos quanto à linguagem, mas igualmente porque, envolvidos com a história, é como se fossem também personagens e, assim, vivessem outra existência, sem nenhum dano para as suas vidas reais, como frisou Ernst Fischer. O lançamento está previsto para abril. A capa, de caráter conceitual, bem diferente dos meus últimos livros, já está definida, e o miolo encontra-se em fase de finalização, nas últimas correções.

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

BAHIA: EDUCAÇÃO SEM LEITURA

Charge de Altair Oliveira da Fonseca.
Domingo agora se realizará a Feira Mensal de Livros no Campo Grande, a primeira do ano. Idealizada por mim, quando à frente da Diretoria do Livro e da Leitura, da Fundação Pedro Calmon, era uma das atividades de livro e leitura que mais agradavam ao falecido professor Ubiratan Castro de Araújo. Aglutina livreiros, editores, leitores e escritores e conseguiu, durante o ano passado, impor uma tradição que não sei se o secretário de cultura Albino Rubim, com o seu ódio aos livros, especialmente de literatura, vai manter. Um poeta meu amigo me telefonou ontem. Durante a longa conversa que tivemos, ele me revelou uma história aterradora. O referido secretário, quando era professor da Faculdade de Comunicação da UFBA, ao receber do poeta seu livro, obviamente um volume de poemas, retrucou, enfiando a mão no bolso e pegando uma cédula para lhe pagar: "Vou comprar, mas não vou ler". Este fato revela, ao mesmo tempo, desprezo pela produção intelectual alheia e falta de educação. Se ele não iria ler o livro, nem deveria comprá-lo. Deveria simplesmente recusá-lo e seguir ministrando suas aulas. É nas mãos desta pessoa que está o destino do livro, da leitura e da literatura na Bahia. Depois desta história, é difícil crer que a Feira Mensal de Livros no Campo Grande dure muito tempo, e ainda mais com a educação que temos, preparando pessoas sem senso crítico e para servir ao mercado de trabalho. Sem falar que o que "eles" querem mesmo é pessoas votando às cegas, em 2014, porque são obrigadas por lei. Certa vez, na feira de livros no Campo Grande, uma jovem repórter de A Tarde me procurou para uma entrevista. Sua primeira pergunta foi: "Por que se lê tão pouco na Bahia?" Respondi, sem hesitar: "Por que a nossa Educação não educa as pessoas para ler". É a verdade, mesmo que não queiramos admitir.

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

AS AVENTURAS DE BIMBA RHUIM E SUA TRUPE

The Brazilian Bombshell. 
1. Desafeto e saia

Chegou a excessos emotivos a recepção a Bimba Rhuim e Papaiva durante a posse dos mesmos no Cecult ― Centro Executivo de Cultura ― do Estado de Baraúna.
Oriundos do povo ― o primeiro foi dublê de anão, mesmo não sendo anão, em Engovewood, e o segundo regeu, com singular êxito, em Caracas, um coral de capivaras ―, ambos prometem democratizar a cultura ― ou será arte? Não importa! Às vezes eles usam uma palavra, às vezes a outra.
Durante os festejos, nos quais não faltaram manifestações artísticas ― ou serão culturais? ―, com cobertura de toda a imprensa de Baraúna, Bimba Rhuim, presidente do Cecult, e Papaiva, chefe cultural, fizeram imitações. O primeiro arrancou aplausos com sua performance de Carla Pérez, célebre dançarina de lundu na Bahia, e o segundo ― nem precisou de frutas para dublar Carmen Miranda.
No dia seguinte, na entrevista coletiva, à mesa, um ao lado do outro e mais dois assessores representativos, Bimba Rhuim ouve a imprensa.
― Sr. Presidente ― começou um repórter ―, como o senhor pretende aparelhar sua equipe? ― e antes que Rhuim o corrigisse, ele emendou: ― Quero dizer, sua trupe?
― Com saia rodada... ― disse, nem alto nem baixo, outro repórter, de modo que todos ouviram e de modo que, mesmo assim, todos se calaram.  

CIDADE SINGULAR, EM BREVE

Foto da capa: Jameson Pedra.
Esta é a capa provisória de Cidade singular. O editor ainda está trabalhando sobre ela, que pode sofrer uma ou outra alteração, nas cores, especialmente.
Em breve, divulgaremos o dia e o local do lançamento e abriremos a opção de compra direta no site da editora, com antecedência e, provavelmente, por um preço mais convidativo. 
O livro reúne contos escritos nos últimos vinte anos. O mais antigo data de 1993, e o mais recente só foi finalizado este ano. Assina a orelha a professora e escritora Dalila Machado. A editora é a baiana Kalango, de Simões Filho.

"A ESTRADA" DO FIM DO MUNDO

Durante os últimos anos, virou moda investir em filmes e romances sobre o fim do mundo. Especialmente por ocasião da virada de 1999 para 2000 e durante o curso do ano de 2012, quando uma certa previsão espúria correu os quatro cantos do planeta. Muito antes deste nosso tempo, em que as modas literárias têm a duração de um sopro, Ray Bradbury escreveu um dos contos mais exemplares e simbólicos sobre o assunto aqui em questão: A estrada. Corria a década de 1950, quando Bradbury escreveu e publicou Uma sombra passou por aqui (The illustrated man, 1951). Ele já era um autor célebre, respeitado por muitos escritores de língua inglesa, como Huxley e Isherwood, por causa da repercussão de Dark carnival (1947) e, sobretudo, de As crônicas marcianas (1950). Com a carreira apenas no início, e três livros importantes publicados, e prêmios acumulados, repercussão nos EUA e no mundo, Bradbury se consagrou definitivamente com Fahrenheit 451 (1953), filmado em 1966 pelo cineasta francês François Truffaut. A trama do conto aqui mencionado é simples, e é isso que deixa o leitor perplexo: Hernando mora com a esposa numa casa à beira de uma estrada de trânsito intenso. Um dia ele percebe que não passa nenhum carro. Por horas e horas. Acha estranho e comenta com a mulher. Então, de súbito, surge um automóvel com um homem e duas ou três moças. Eles estão apavorados e querem um pouco de água para pôr no radiador. Hernando traz a água, e todos ficam agradecidos. As mulheres não param de chorar, no entanto. E o motorista diz para Hernando que explodiu a guerra atômica, que tudo vai se acabar, é o fim do mundo. E vai embora. Em casa, a mulher pergunta o que aconteceu. Hernando responde; "Nada". E depois pergunta a sim mesmo: "O que eles quiseram dizer com o fim do mundo?" Alienação, alheamento, desdém, ignorância, atribuam a este comportamento o que quiserem, mas Hernando é quem menos vai sofrer. A última edição brasileira de Uma sombra passou por aqui é a da extinta Edibolso, 1976, com tradução de Ruy Jungmann. São vinte contos enquadrados entre um prólogo e um epílogo.

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

MINICONTOS REAIS, 2: KARNAVAL

O Carnaval. Entre os foliões...
O Dr. Spinola, médico respeitado em Juazeiro, foi passar o Carnaval em Salvador. Do camarote de luxo, ao lado de amigos e familiares, viu o circo passar, a noite inteira. Riu, dançou, fez os comentários comuns em tais ocasiões. Quase de manhã, ao deixar o local, foi surrado sem motivo algum por uma súcia de foliões e, em seguida, internado num hospital, onde veio a falecer. Em sua cidade, houve comoção durante o seu sepultamento, que reuniu centenas de pessoas, ao passo que, em Salvador, os responsáveis e as autoridades já planejam o próximo Carnaval.

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

LEITURAS, 22: A PROVA DO MEL

A prova do mel (Objetiva, 2009) é de Salwa Al-Neimi, escritora síria radicada em Paris, e foi publicado inicialmente por uma editora do Líbano. Narra o cotidiano de uma bibliotecária que lê e, ainda mais estranho, lê os livros proibidos, os livros árabes escritos para “ser lidos com uma só mão” e que educam para a prática da cópula. Mas ela o faz de maneira escusa, colocando-os dentro de outros livros. Certa de que ninguém conhece seu ambicioso hábito de leitura, a moça segue sua rotina, até que um dia é convocada pelo diretor da biblioteca, que lhe comunica que a inscreveu para fazer uma palestra sobre os livros eróticos árabes na exposição Inferno dos Livros, nos EUA. Daí por diante, enquanto intensifica suas leituras, que agora ganharam um propósito justificável (como se simplesmente ler e atingir o conhecimento, qualquer que seja, não fosse o bastante), ela nos apresenta, com seu relato, o que aprendeu naqueles livros e como o pratica com seu amante, o Pensador, e outros homens, ao passo que entrevista mulheres para saber mais sobre a vida sexual das pessoas que estão à sua volta. Audacioso, austero e sofisticado, A prova do mel apresenta uma poética reflexão sobre a condição da mulher, de homens e mulheres que não vão para a cama dormir e de um mundo que sufoca seus desejos em favor de obscuros dogmas. Talvez a frase que resuma este belo livro seja a que está no capítulo VII, “O corpo é quem inicia a história”, embora a sua epígrafe seja mesmo o que dizia Ibn-Arabi: “A prova da doçura do mel é o próprio mel”.

Publicado originalmente na coluna Crítica Rasteira, da revista Verbo 21, em janeiro de 2013.

terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

LINDAS CAPAS, 6: XANGAI BABY

Aos vinte e cinco anos, Wei Hui foi considerada uma revelação literária em seu país e, quase imediatamente, no mundo. Pouco depois, a China a sentenciou “decadente, devassa e escrava da cultura estrangeira”, queimando em praça pública 40 mil exemplares do seu livro Xangai Baby, o que só fez aumentar o interesse por sua obra. Com o propósito de se defender, mas não se justificar, a autora afirmou que o conteúdo de seu romance é fruto de sua experiência de vida: família rígida, inútil treinamento militar na faculdade, rebeldia e sexo. “Foi sobre isso que escrevi”, um relato semi-autobiográfico por excelência. Mas esqueça que ouviu ou leu sobre tais peripécias e, impelido(a) por esta linda capa, cheia de sugestões, mergulhe na obra, para enfim julgá-la e à autora. Assim como esta ousada fotografia revela e oculta, espicaçando a imaginação, toda e qualquer opinião sobre uma obra prescinde do que é indecoroso e destaca o que é conveniente ou o inverso.