"Eu respirava naquelas salas, como um incenso, esse cheiro de velha biblioteca que vale todos os perfumes do mundo." Antoine de Saint-Exupéry

quarta-feira, 28 de outubro de 2015

OI, VERGONHA!

"Oi, eu sou péssima!"
Desde domingo que os moradores dos Barris que têm telefone fixo da Oi estão sem linha. Liga-se para a operadora, e quem atende é o robô, de nome Eduardo, que informa o seguinte: os técnicos da Oi estão trabalhando na região e asseguram que o conserto ficará pronto às 23:59 do dia corrente.

Mas, no horário previsto, nada de linha. O novo prazo informado passa então a ser 23:59 do novo dia. E assim vamos: domingo, segunda, terça, quarta. O resto do mês talvez.

E, para o cúmulo do absurdo, a Oi nos telefonou hoje para que respondêssemos a uma pesquisa de satisfação quanto aos serviços. Tiveram o desplante de nos sugerir uma nota de avaliação, de zero a 10. São uns cínicos se não sabem que nota merecem.

"Alô, eu funciono!"
Arre! Como diziam os antigos. Alíás, acho que muita coisa antiga deveria voltar. O velho telefone, por exemplo, simples, direto e eficiente.

terça-feira, 20 de outubro de 2015

A EDUCAÇÃO LIQUIDADA

A educação neste país de lulistas aproveitadores e cínicos é tão esculhambada, que um dos mais sérios sebos do Brasil, a Traça, me enviou um e-mail comunicando (de maneira jocosa, claro, mas consciente do que diz, pois, como afirmava Freud, brincadeiras não existem) que a educação está liquidada. Eis o texto:

A Educação Liquidada
Olá, Mayrant Gallo,
Por uma dessas coincidências fortuitas, bem como quando o final do ano letivo de aproxima, adquirimos uma grande biblioteca de Pedadogia e Educação, incluindo Psicologia da Educação. É uma biblioteca bem desigual, com material antigo e moderno, técnico e de debate, do bebê ao universitário.
O acervo está sendo oferecido com desconto de 50%, adequado aos tempos de aperto, com preço mínimo de R$ 4,90.
Veja os livros aqui.

Lembre que você tem um crédito de R$ 29,15 e com ele você pode abater até 50% do valor do produto comprado. Veja detalhes do programa de fidelidade da Traça aqui.

Esperamos você,
Traça Livraria e Sebo

É fato. A educação está liquidada, e devemos tirar proveito disso. O Governo é o primeiro, reelegendo-se a cada eleição através do baixo senso crítico do povo, que, em meio ao caos e vítima do embotamento intelectual, deixa-se conduzir pela mão, como uma criança amedrontada. Ó, pátria educadora!

terça-feira, 13 de outubro de 2015

VÁ E VEJA, 25: Picnic at Hanging Rock

Mais ou menos ao fim do primeiro terço do filme, quando se dá a sequência-chave para se compreender sua misteriosa trama, Marion, uma das moças, olhando do alto da montanha para o bosque lá embaixo, diz, como se refletisse consigo mesma:

"O que aquelas pessoas estão fazendo, lá embaixo? Parecem um monte de formigas. É surpreendente o número de seres humanos sem propósito. Embora seja provável que eles estejam desempenhando uma função, desconhecida até para eles".

Ao que sua colega Miranda retruca: "Tudo começa e termina na hora certa e no lugar certo".

Lançado em 1975, Piquenique na montanha misteriosa constitui a obra-prima de Peter Weir e um dos clássicos do criativo cinema australiano. Sua trama, baseada num romance de Joan Lindsay, mantém-se até hoje como um mistério polissêmico e insolúvel. Era um fato real, que gerou um romance, e este, por sua vez, um filme belo e desconcertante. Em 1001 filmes para ver antes de morrer, afirma-se: "Uma história de fantasmas sem fantasmas, um quebra-cabeça sem solução e um filme de repressão sexual sem sexo". Muito embora o que se diga naquele livro sobre o filme seja grandioso, é pouco para definir esta joia cinematográfica, sempre atual e indecifrável.

A história chega a ser banal e, não fosse o fato de ser verdade, não despertaria grande interesse, exceto para aquelas pessoas que, como eu, apreciam o tema do desaparecimento: em 1900, na Austrália, uma escola de garotas realiza um piquenique ao pé da Hanging Rock. Três garotas e uma professora desaparecem nos interstícios da montanha, e este evento acaba por abalar não só a escola mas toda a região.

Entregues à missão de achar as mulheres, as pessoas tentam, sem sucesso, explicar o que houve. Mas nada é muito claro, e mesmo o desaparecimento, narrado como a fração de um sonho, sugere que as garotas se entregaram a uma espécie de rito pagão, em nome do deus Pã, que rege a natureza e era adorado pelos pastores antigos. Esta sequência, aliás, é um dos pontos altos do filme e de todo o cinema, pelo modo como é concebida, chegando a nos assustar, sem que para isso nenhum clichê dos filmes do gênero suspense seja evocado. Pelo contrário: de pés nos chão e um ar alheio, como se estivessem dopadas ou possuídas, as vestes brancas a se desfraldar no vento, com as botinas amarradas à cintura, e filmadas em câmara lenta, as moças nos incitam a acreditar que elas sabem o que estão fazendo, e que os ingênuos somos nós.

Mas este filme não teria a força que tem, nem a importância que obteve ao longo dos anos, se não fosse a sua forma, que eleva seu assunto trivial ao nível da Arte: música, fotografia, ponto de vista narrativo, reconstituição de época, a atuação despretensiosa dos atores, especialmente do elenco jovem, a celebração da natureza como um cosmo imponderável e a opção do diretor e do roteirista por não explicar o estranho acontecimento que compreende o seu núcleo fazem deste filme um marco das obras cinematográficas que optam pelo mistério e pela polissemia, em detrimento do panfleto e da suposta verdade do mundo.

Em comemoração aos 40 anos da existência desta obra-prima, veja-a! E depois reconheça que, de fato, é com filmes assim que o cinema se ombreia com suas rivais da grande Arte: a pintura, a música, a literatura.

sexta-feira, 9 de outubro de 2015

LANÇAMENTO: "FERNANFLOR"

Sidney Rocha, integrante de 82, uma Copa, quinze histórias (Casarão do Verbo, 2012), lança seu novo romance em Salvador, este sábado, às 16:00, na Boto Cor de Rosa, Rua Marquês de Caravelas, 328, Barra. Passe por lá, conheça a livraria, beba um café e participe da conversa do autor com o escritor Lima Trindade.

quarta-feira, 7 de outubro de 2015

MERCADANTE, O CURINGA

Coringa, sucedâneo ou avatar de Aloizio Mercadante.
Assombrou-me a notícia de que o curinga Aloisio Mercadante é o novo Ministro da Educação. 

Desde o governo de Luís Inácio Lula Maracutaia da Silva que este sujeito não larga o osso. É um verdadeiro mercador de oportunidades. Abre uma vaguinha aqui ou ali, e ele é chamado para ocupar o cargo ou a este se dispõe. Entende de tudo: de alfabeto cirílico a turbina de avião. 

Sua nomeação para o ocupar o cargo de Ministro da Educação é mais uma evidência de que a presidente está à deriva, e o país, em maus lençóis. 

Uso destes clichês linguísticos, porque é o que funciona: diante de um Governo banal, frases e expressões banais; para se refletir sobre esta figurinha mais do que surrada, Mercadante, ocupando o cargo de Ministro da Educação, não precisamos de muito. O banal mesmo serve. E bem.

Uma vez no poder, ele e seus correligionários ficam lá, nos intestinos da cúpula, brincando de trocar de cadeiras. Enquanto isso, violência generalizada em todo o país, saúde à míngua e educação da pior espécie. Isso até 2018, quando o Lula Maracutaia pretende voltar à presidência e fazer a roda girar do mesmo jeito de agora e ainda mais favorável a eles, num cinismo sem fim.

"Este país é uma choldra." Eça de Queiroz

Será que Mercadante sabe o que é uma "choldra"? Será que ele sabe que "curinga" se escreve com "u"? Que "coringa" é outra coisa? Duvido muito. Ele não vai além de leitor de Batman em ficção. Ou nem isso. O certo é que, como o célebre vilão, à boca pequena e à socapa, eles estão rindo de todos nós, pobres eleitores e membros do maior Clube de Otários que existe, cuja carteirinha de sócio é o título eleitoral.

quinta-feira, 1 de outubro de 2015

SORRIA, VOCÊ ESTÁ NA BAHIA!

Foto: por Hithotel.
Para o Governo do Estado da Bahia, capitaneado pelo famigerado Rui Costa, e igualmente para a Prefeitura de Salvador, sob a direção de ACM Neto, vai tudo muito bem por aqui. Salvador é um paraíso tropical à espera de mais uma leva de milhares de turistas, que devem ficar pela cidade de dezembro a março, em mais um verão escaldante, barulhento e sujo, com a violência de sempre. A prova irrefutável foi o que eu vi na última segunda-feira, a céu aberto, em plena luz do dia, entre 15 e 16 horas.

À procura de um produto que só se encontra no Comércio, somei a isto o fato de que adoro andar e fui a pé até o famoso Mercado do Ouro. Eu atravessava a praça, quando surpreendi a pouco mais de quatro metros, um cara vendendo um revólver para dois outros. Estavam lá, numa boa, negociando. Do outro lado, a menos de 50 metros, dois policiais, montados em motocicletas, conversavam...

Cumprida a minha missão, subi pelo Taboão até a Baixa dos Sapateiros. Antes, ao passar perto da Igreja Rosário dos Pretos, avistei três policiais, que papeavam alegremente na esquina. Pois bem, a menos de dez metros, um cara, sentado na soleira de uma casa, enrolava um cigarro de maconha, numa boa... Não sei quantos se drogavam tranquilamente, nos arredores, sob as barbas da polícia. Talvez dezenas. 

Da Baixa dos Sapateiros subi pela Ladeira da Palma até a Rua da Mouraria. E foi ali que a evidência de que Salvador e a Bahia estão entregues ao crime se mostrou plena e incontestável. Eu caminhava pela calçada, uma pessoa à minha frente e outra mais atrás, quando passou por nós um rapaz, de mais ou menos 17 anos, com um revólver na cintura, enfiado no cós da bermuda. E ele andava calmamente, a passeio, dando tapinhas na arma, como se quisesse com isso nos alertar ou ameaçar. A menos de vinte metros, o quartel do Exército dormitava ao sol, com duas sentinelas a postos.

Três cenas. Três evidências de crime. Três possíveis desdobramentos violentos para as próximas horas ou os próximos dias. E a polícia observando tudo, condescendente.

Enquanto isso, como diria Drummond, o governador e o prefeito tiram ouro do nariz.