"Eu respirava naquelas salas, como um incenso, esse cheiro de velha biblioteca que vale todos os perfumes do mundo." Antoine de Saint-Exupéry

terça-feira, 28 de fevereiro de 2017

LEITURAS, 52: MATADOURO N. 5

Artenova, 1972. 1a. edição brasileira. Rara.
A gente lê um livro, gosta ou gosta muito e depois o esquece. Décadas mais tarde, passeando pela estante, olhamos aquela leitura antiga e nos perguntamos se ainda vale a pena. Abrimos o volume, velho, empoeirado, surrado, talvez a primeira edição brasileira, o autor ainda colocava ao fim do nome a abreviatura de júnior, que foi abandonada com o passar dos anos, e lemos a primeira página, o primeiro capítulo, e logo estamos pelo meio, mais fascinados do que da primeira vez. Ou seja, o livro melhorou com o tempo, e nós aguçamos nosso olhar, alcançamos novos aspectos, atentamos para a ironia, a forma, os devaneios estruturais. Matadouro n. 5 (Artenova, 1972) é ainda, e sempre será, uma obra incomum e deliciosa. Literatura de verdade. E diversão, riso, prazer. Esqueçam estes livros de estação, "garota disso, garota daquilo", que muito prometem, mas pouco oferecem, e se deleitem. Vonnegut é cortante, com reflexões assim: "Como tantos americanos, estava procurando construir uma vida que tivesse sentido com objetos que encontrava em lojas de presentes". Ou então: "Estava tão confortável lá dentro que pôde fingir estar a salvo em casa, tendo sobrevivido à guerra, e que estava contando a seus pais e à sua irmã uma história verdadeira da guerra, ao passo que a história verdadeira de guerra ainda estava se desenrolando". O autor já morreu, não dá mais para conversar com ele, nem pegar autógrafo, a não ser sobrenaturalmente, mas há edições novas; portanto, ele está ali, bem vivinho, na prateleira da livraria mais próxima. Isso ainda não nos tiraram.

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